Por Marcelo Guernieri
“Não é todo mundo que vai entender o seu propósito.
Mas tudo bem, não é o propósito deles, é o seu.”
Quando foi que a bússola virou enfeite de mesa?

A maioria dos médicos entra na faculdade com uma bússola moral quase infalível: servir, aliviar a dor, honrar o jaleco branco. Mas, à medida que os anos avançam, essa bússola vira peça de decoração — bonita, mas inútil. São as pressões do sistema, o olhar fiscalizador de colegas, o “padrão ouro” de sucesso alheio. Resultado? Um exército de profissionais competentes e frustrados, presos em rotinas que atendem a todo mundo, menos a si mesmos. (relaxe, não vou falar da metáfora da máscara de oxigênio do avião)
Se você sente esse aperto no peito, respire: você não está “viajando”. Está apenas escutando o alarme interno que alerta quando seu propósito foi sequestrado.
Propósito não é democracia
O estoico Marco Aurélio já dizia que viver de acordo com a própria natureza é a única rota que leva à serenidade. “Se for correto, faça; se for verdadeiro, fale”, aconselhava o imperador-filósofo . Propósito não se submete a votação popular.
Isso não significa agir com arrogância. Significa ancorar-se num compromisso pessoal que, em última instância, beneficia outros — mas sem terceirizar a bússola. E outro autor, que é meu mentor, Seth Godin concorda: no “Vão” entre a mediocridade e a excelência, a maioria desiste. Quem persiste torna-se “o melhor do mundo”… no seu mundo específico.
Por que tanta gente torce o nariz?
- Ameaça implícita. Ao viver seu propósito, você expõe a falta de ousadia de quem segue no automático.
- Quebra de roteiro. Você foge do script que colegas, família ou instituições escreveram para você.
- Enrolêutica alheia. A maioria das críticas vem de quem, secretamente, gostaria de ter a mesma coragem.
R.Holiday explica que o ego cria narrativas de validação externa; quando não recebemos aplausos, ele grita “perigo!” . Silenciar esse eco é condição para avançar sem o “OK” da plateia.
Estratégia: três filtros para proteger (e rentabilizar) seu propósito
| Filtro | Pergunta Cirúrgica | Resultado Prático |
|---|---|---|
| Éticos | “Se Marco Aurélio estivesse ao meu lado, eu sentiria vergonha?” | Garante coerência moral e reputação a longo prazo. |
| Financeiro | “Isso cria valor tão alto que o paciente se sentirá ‘bobo’ em dizer não?” | Ofertas irresistíveis, preços justos e lucro saudável. |
| Impacto | “Essa decisão me posiciona no lugar onde quero ser lembrado?” | Afinidade entre propósito, marca pessoal e audiência. |
O preço de ser incompreendido (e por que vale a pena pagá-lo)
- Solidão temporária. O telefone toca menos quando você diz mais “não”.
- Risco financeiro. Os primeiros meses fora do emprego “seguro” testam o caixa e a fé.
- Auto-crítica corrosiva. O cérebro repete: “E se eles estiverem certos?”.
Mas o retorno compensa: pacientes que vibram com sua visão, tempo para estudar o que importa, energia para inovar. E, acima de tudo, a paz de dormir alinhado com a própria bússola.
Checklist prático para médicos em transição
- Escreva seu propósito em 1 parágrafo. Se não couber numa folha A4, está prolixo.
- Mapeie os ‘stakeholders’. Quem será beneficiado? Quem ficará desconfortável? Prepare-se.
- Construa ponte de segurança financeira. Três a seis meses de reserva dão sustentação à coragem.
- Comunique-se. Conte a história antes que inventem uma para você.
- Cerque-se de pares estratégicos. Mentores, masterminds, redes de proteção formada de pares que tenham a sua visão e valores e equipe que compartilhem valores.
- Revise trimestralmente. Propósito é estável; estratégia, não. Ajuste as rotas.
Uma metáfora final pra refletir, mesmo que você não seja um médico cirurgião ok?
Imagine seu propósito como um laser cirúrgico: energia concentrada que cauteriza distrações e abre espaço para a cura — sua e dos pacientes. O laser não pede permissão ao tecido doente; ele simplesmente faz o que precisa ser feito. Quem assiste pode não entender a precisão do corte… até ver o resultado no pós-operatório.
O mundo não precisa de mais médicos que cabem em moldes pré-fabricados. Precisa de profissionais que se atrevem a ser íntegros consigo mesmos — e, por isso, entregam valor extraordinário.
Pergunta para você refletir antes de fechar esta aba:
Qual micro-decisão poderia, hoje, alinhar seu dia com o seu propósito — e não com o dos outros?
Escreva nos comentários. Vamos continuar esse diálogo de quem já decidiu que bússola é instrumento de navegação, não enfeite de mesa.
Marcelo Guernieri – Mentor de estratégia e marketing para médicos, discípulo de Marco Aurélio e opositor convicto da medicina sem propósito.
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